sábado, fevereiro 23, 2019

Os Escorpiões

Na ausência da luz os escorpiões manifestam-se
Pérfidos seres que habitam os dejectos da mente
Metastizam-se no âmago contaminando o ser
O solimão invade os canais mais íntimos
Perfurados pelos cruéis télsones esvaem-se em dor e desespero
Um lúgubre transe invade o cosmos numa módica elegia
E então manifesta-se a epifania preciosa:

A inevitabilidade… aquele momento em que se abdica do controlo
Controlo fictício que não é mais do que um sofisma congénito
E que naquele ensejo em que perdemos a candura
Faz cessar a persuasão e desmascara a fraude
Simultaneamente com a severa realização
Finitude, absurdo, abismo, reles polilha desterrada que habitará o nada
Disforme lar perpétuo, imaterial, ausente de propósito e razão

No auge da revelação da solidão insanável
Mergulhados nessa letargia lancinante
 Activam-se os artifícios inatos de defesa
Exasperam-se a mágoa e a repulsa até danificar os receptores
E aí surge uma dócil serenidade que corrompe as trevas
Definha os lacraus que se transmutam em cúmplice endorfina
E num êxtase: a paz…

Serenidade… o recobro do poder de alienação
O despejo da martirização inútil, o desapego da compreensão
A aceitação da condição imutável e seu consentimento
Subitamente o desvendar da elementar solução
Já outrora encontrada pelo criador/descobridor
Das qualidades e metamorfoses da matéria e substâncias
A imortalidade propaga-se na alomorfia resultante do contacto com o outro